Edelweiss Piraten

Grupos juvenis como os Kittelbach Piraten (Düsseldorf), os Navajos (Colónia) ou os Fahrtenstenze (Essen), embora oriundos de cidades várias e de backgrounds distintos, todos eles se consideravam como parte integrante de uma ideia maior, de um modelo que todos assumiam, do movimento geral denominado Edelweiss Piraten (os Piratas Edelweiss). O ponto de união de todos estes bandos de jovens alemães (cuja origem remonta aos finais da década de 30) residia num espírito livre, num amor pelo campo e pela natureza, numa indumentária característica (camisa axadrezada, calções pretos e meias brancas) acompanhada por adornos específicos (como alfinetes metálicos representando a flor Edelweiss, uma caveira sob dois ossos cruzados, entre outros) e um ódio de estimação comum a todos eles, a Hitler Jugend (Juventude Hitleriana). Viessem de onde viessem, todos estes rapazes e raparigas (regra geral, de idades compreendidas entre os 14 e os 18 anos) tinham como principal objectivo esquivar-se à integração nos movimentos juvenis criados pelo regime, isto é, a Jungvolk (sobretudo durante a infância e a maior parte da escolaridade), a Hitler Jugend (entre os 14 e o 18, e aqui se percebe o porquê de tamanho antagonismo entre os dois movimentos) e, finalmente, o Reicharbeitsdienst (a partir dos 19 e até aos 25, com o intuito final de criar soldados para a frente de combate). O Terceiro Reich pretendia assim garantir o controlo sobre os jovens desde a mais tenra idade. E estes tudo fariam (e fizeram) para contrariar semelhantes modelos.

Mas estes jovens, na sua maioria provenientes de classes baixas da sociedade, encontravam-se num momento das suas vidas em que saíam da instituição-escola e ingressavam na instituição-trabalho. Muitas das vezes como aprendizes em trabalhos desqualificados mas, com a crescente falta de adultos entretanto mobilizados pela guerra, por vezes mesmo em posições de maior responsabilidade e salário. Muitos deles mudavam frequentemente de trabalho, ou por que se "pegavam" com a entidade patronal, ou por que se ausentavam das oficinas e fábricas por períodos além do aceitável (se casos houve em que a ausência era um acto de sabotagem à produção, na maior parte dos casos apenas revelava desejo de fuga). Os dados revelam que uma larga maioria destes jovens não tinha já pais, ou se encontrava já de uma forma ou outra ao largo de qualquer autoridade paternal, o que explica em muito o seu estilo de vida, e práticas.

O meio laboral, as relações de vizinhança e as amizades que vinham dos tempos de estudantes eram os principais motores de união e de surgimento destes grupos urbanos. A cidade era deles. A esquina era ponto de encontro; o beco ponto de confronto; o parque de diversões, bem, ponto de diversão. Mas se a cidade era deles,eles, por outro lado, eram do campo, da campagne. A sua alma, a sua liberdade, eles a encontravam nas longas saídas que organizavam em direcção aos vários corações naturais da Alemanha. A pé, de bicicleta, ou à boleia, as viagens destes jovens eram, por vezes, de grande monta, chegando a distâncias superiores a 100km. O que é, só por si, um enorme feito, tendo em conta a proibição de viajar vigente e as péssimas condições no que toca aos transportes públicos de então. Não raras vezes grupos de uma cidade encontravam pelo caminho grupos de outra cidade e em conjunto seguiam caminho. Sempre e somente equipados de mochilas, farnel frugal e, acima de tudo, instrumentos musicais. A música foi sempre uma das mais fortes expressões dos Edelweiss Piraten, o meio pelo qual escapavam a miséria dos tempos e almejavam por futuros mais risonhos. Atente-se nas palavras da seguinte canção:
«We all sat in the tavern,
With a pipe and a glass of wine,
A goodly drop of malt and hop,
And the devil calls the tune.

Hark the hearty fellows sing!
Strum that banjo, pluck that string!
And the lasses all join in.
We're going to get rid of Hitler,
And he can't do a thing.

The Hamburg sirens sound,
Time for Navajos to go.
A tavern's just the place
To kiss a girl good-bye.
Rio de Janeiro, caballero, ahoy!
An Edelweiss Pirate is faithful and true.

Hitler's power may lay us low,
And keep us locked in chains,
But we will smash the chains one day,
We'll be free again.
We've got fists and we can fight,
We've got knives and we'll get them out.
We want freedom, don't we boys?
We're the fighting Navajos.

Out on the high road, down we ditch,
There're some Hitler Youth patrolmen
and they're getting black as pitch.
Sorry if it hurts, mates, sorry we can't stay,
We're Edelweiss Pirates, and we're on our way.

We march by banks of Ruhr and Rhine,
And smash the Hitler Youth in twain.
Our song is freedom, love and life,
We're Pirates of the Edelweiss.»


As referências (na música) às zaragatas com membros da Hitler Jugend não são pura gozação. Pelo contrário, eram frequentes e não menos vezes tinham resultados drásticos. De tal maneira que gradualmente as autoridades foram monitorando as suas actividades e, por fim, tomando medidas de repressão. Um bom exemplo da repressão sentida por este movimento são as prisões (a 7 de Dezembro de 1942) de 10 grupos (contando 283 elementos) em Düsseldorf, de 10 grupos (contando 260 elementos) em Duisburg, de 4 grupos (contando 124 elementos) em Essen e de mais 4 grupos (contando 72 elementos) em Wuppertal; todos estes jovens eram posteriormente destinados a casas de correcção, detenção prisional temporária, campos de trabalho e mesmo julgamentos em tribunal. Um caso mais dramático foi o de Barthel Schink (juntamente com outros camaradas seus), um dos líderes dos Edelweiss Piraten da área de Colónia, que no fim de Novembro de 1944 viu a sua aventura terminar por meio de enforcamento público.

À semelhança da Swing Jugend também estes grupos eram constantemente rotulados pelas autoridades como sexualmente desviados e promíscuos. Também no caso destes as acusações ficam aquém da realidade.

Politicamente eram, na maior parte, desligados ou impotentes, mas estão relatados casos em que distribuíam pelas caixas do correio dos seus bairros panfletos aliados (que encontravam perdidos nas florestas aquando das suas surtidas); em que davam escolta e abrigo a desertores e prisioneiros de guerra; em que se dedicavam a actos de sabotagem declarados, numa luta que em muito se assemelhava à noção de guerrilha (o chefe da Gestapo de Colónia caíu mesmo nas mãos destes jovens); em que estreitaram laços e ligações com grupos comunistas e clandestinos. Embora não fossem abertamente politizados (como, por exemplo, os Leipzig Meuten) tudo faziam, no entanto, para contrariar os esforços de guerra e todos sonhavam com um fim para o inferno em que viviam.

Até há bem pouco tempo estes grupos de jovens eram pura e simplesmente referidos e catalogados como delinquentes e, consequentemente, deixados de fora da narrativa histórica. Recentemente, contudo, levanta-se uma nova leitura e sede de descoberta desta juventude já distante. Em 1984 o Memorial Yad Vashem prestou uma homenagem a Jean Jülich, um dos sobreviventes de um destes grupos, na sequência da edição das suas memórias (que inclusive deram um documentário — Edelweisspiraten).
As seguintes fotografias são do autor, que figura na primeira, em pé com uma viola, o primeiro à direita.















Informação maioritariamente recolhida de PEUKERT, Detlev J. K. – Inside Nazi Germany. Conformity, Opposition, and Racism in Everyday Life; Yale Univ. Press, New Haven and London, 1987. As citações e a 1.ª fotografia são retiradas desta obra.


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